Quando a independência é o nome de uma constelação
[ When independence becomes the name of a constellation ]
by Adriano Mixinge
When visiting this exhibition, remember that there are several elements that make the artistic work of Iris Buchholz Chocolate remarkably solid: she combines meticulous technical and artisanal craftsmanship with deep research in history, anthropology, and aesthetics. She carries out an ingenious material and formal deconstruction of the chosen theme, boldly embracing her commitment to the duty of memory and historical and political respon-
sibility in relation to some of humanity’s most violent periods, such as Colonialism and Slavery.
Inspired by the title of Salman Rushdie’s book*, the artist first reminds us that midnight marks
the threshold where one day ends and a new one begins—a possibility that emerges at dawn and must manifest itself luminously. Darkness will repeatedly surge and dissipate with the force and breath of transcendental things. In this interplay of twilight—between the night that was and the day that begins—we can better discern objects, bodies, and ideas.
Secondly, by reinterpreting the Dikenga Dia Kongo (Kongo Cosmogram), which “expresses the origin and destiny of humanity,” Iris Buchholz Chocolate dares to propose the crea-
tion of a new constellation called “Indepen-
dence.” With this beautiful, foundational act, she paves the way for understandings and prac-
tices that express the essential elements of the “Civilization of the Universal,” as envisioned by Léopold Sédar Senghor—a singular recreation of a legacy that belongs to all of humanity.
Enjoy the exhibition Midnight’s Children by
Iris Buchholz Chocolate. Seen as a whole, it is simultaneously a conceptual work, a sculptural space, and a cosmogram. Visitors are invited to participate in an exercise that, though rooted in imagination, they may experience as if taking part in a happening.
In this space, the artist formally and concep-
tually reinterprets the dates of African indepen-
dences and the legacies of Africans and their descendants in shaping the history of human-
ity. She transforms these into stars in a new constellation that, here for the first time, we may navigate, see, and even, perhaps, listen to.
Alongside the sound installation The Witness made out of plants and sounds of the tropical rainforest to evoke both sides of the “Black Atlantic” (Paul Gilroy), where crimes against humanity were committed—Iris Buchholz Chocolate offers us, in the form of visual meta-
phors, the echoes of the uninterrupted and resounding call of Midnight’s Children.
Adriano Mixinge
Historian, curator and art critic
* In Salman Rushdie’s novel children born at midnight of India’s independence date are imbued with magical powers.
Ao visitarem esta exposição lembrem-se, de
que há uma série de características que tornam muito sólida toda a obra artística de Iris Buchholz Chocolate: ela une ao trabalho técnico e oficinal preciosista uma profunda pesquisa em História, Antropologia e Estética; faz uma desconstrução material e formal ingeniosa do tema a tratar; assume o seu comprometimento com o dever de memória e de responsabilidade histórica e política face aos períodos mais violentos da história da humanidade como o foram o período do Colonialismo e o da Escravatura.
Socorrendo-se do título do livro de Salman Rusdie*, a artista recorda-nos, em primeiro lugar, que a meia-noite é o límite a partir do qual um dia termina para depois, deixar surgir
o outro como uma possibilidade que, do aman-
hecer em adiante, deverá consumar-se de forma luminosa: reiteradas vezes a oscuridão irrom-
perá e se desvanecerá com o ímpeto e a respira-
ção das coisas transcendentais e, num lusco-fusco entre a noite que já era e o dia que começa, poderemos discernir melhor os objectos, os corpos e as ideias.
Em segundo lugar, reinterpretando o Dikenga Dia Kongo (Cosmograma Kongo), que “expressa a origem e o destino da humanidade”, Iris Buchholz Chocolate ousa propor-nos a criação de uma nova constelação chamada “Indepen-
dência”: com este belo gesto fundacional, ela abre caminho à entendimentos e à práticas que expressam elementos essenciais da “Civilização do Universal” de que falara Léopold Sedar Senghor, numa recriação singular de um legado que pertence a todos os seres humanos.
Desfrutem da exposição “Midnight’s Children / Os Filhos da Meia-Noite” de Iris Buchholz Chocolate: vendo-a como um todo ela é, simul-
taneamente, uma obra conceptual, um espaço escultórico e um cosmograma, em que o visitante é convidado para um exercício, que sem deixar de ser imaginário, ele poderá, de facto, vivenciá-lo como se participasse num happening.
Nesta sala, a artista reinterpreta formal e conceptualmente as datas das independências africanas e dos legados dos africanos e dos afrodescendentes à história da humanidade transformando-as em estrelas de uma nova constelação que, aqui, pela primeira vez, poderemos percorrer, vê-las e, porventura,
até ouvi-las.
Juntamente com a instalação sonora “A Testemunha” composto de plantas e sons da floresta tropical para evocar ambos lados do “Atlântico Negro” (Paul Gilroy) em que os crimes contra a humanidade foram cometidos, Iris Buchholz Chocolate oferece-nos, em forma de metáforas visuais, os ecos do grito ininter-
rompido e actual dos “Filhos da Meia-noite”.
Adriano Mixinge
Historiador, curador e crítico de arte
* No romance do Salman Rushdie as crianças nascidas à meia-noite da data de independência da Índia estão imbuídas de poderes mágicos.